sábado, 28 de junho de 2014

O "dilema" japonês nas 24 Horas de Le Mans

Saudações, leitores! Passei alguns dias fora das atividades por aqui, graças ao meu PC problemático (que brinca de reiniciar inesperadamente) e outras coisas em paralelo a este blog, como a administração de um campeonato online que estou participando, o SUPER GTS. Aproveitando este gatilho, irei fazer um post muito em breve, pois o assunto de hoje é Le Mans, mais precisamente, o "dilema" que os japoneses tem com a prova.

Ora, Nagano, não entendi o título do post. Que dilema é este que você fala? Já chego neste ponto. Esse é um post um tanto curioso pra você que curte se atentar aos fatos.

As 24 Horas de Le Mans ainda não saiu da minha cabeça. E creio que não sairá, ao menos esta corrida de 2014 ficará marcada pra mim até o último dia do ano, onde no dia seguinte, o mundo, as coisas, os feitos, os pensamentos, são novos. É por esse motivo que estou escrevendo um post das 24LM agora, no dia 28 de junho, duas semanas depois de mais uma vitória da Audi. A minha principal inspiração para este post é justamente lembrar dos maiores feitos nipônicos na prova de resistência mais emblemática do mundo e observar a insistência (e azar) que eles têm nela. 

A imagem que ilustra o post é uma delas. É a primeira vitória da história de um carro japonês nas 24 Horas de Le Mans. Um feito histórico relatado em 1991, onde o Grupo C acabara de sofrer uma das regulamentações que, aos poucos, estava desencorajando muitas equipes a continuar participando das provas de resistência. Damn it, FIA! Não mexe nos pauzinhos, não! Naquele ano, uma das mudanças eram os novos motores de 3.5 litros e, também, o aumento de peso excessivo para os carros nas 24 Horas de Le Mans, que acabou prejudicando tais concorrentes (como a Jaguar, Mercedes-Benz e a novata Peugeot) que, por mais que tivessem construídos novos carros, preferiram optar por correr com o carro da temporada anterior (Le Mans fazia parte do World Sportscar Championship). Como o regulamento favoreceu os novos carros 3.5L, o grid das 10 primeiras posições foram reservadas aos carros deste tipo, que correram o campeonato como "C1".

Entre toda essa confusão, estava a Mazda, em mais um ano tentando chegar na frente. Levou para a prova dois 787B (um deles composto pelo brasileiro Maurizio Sandro Sala) e um 787 comum alimentados por um 4-rotor novíssimo de 2.6 litros. Mas antes da corrida, para... demonstrar insatisfação com o novo regulamento, pediu a FIA uma autorização especial de competir as 24 horas com o carro mais leve – e conseguiu. Com a carta branca deles e das montadoras mais fortes (que foram otárias e levaram uma sova da malandragem japonesa), os dois Mazda 787B e o 787 correram a folclórica corrida com apenas 830 kg. Muitos consideram esta ação uma trapaça até hoje. Outros, consideram uma brecha um tanto bem explorada.
Mas não é nesse ponto (das brechas) que quero chegar. O carro #55, partindo da 17ª posição venceu na confiabilidade e foi o primeiro carro da história do Japão a terminar em primeiro lugar nas 24 Horas de Le Mans e talvez seja o único carro até o fim da existência desta corrida que venceu com um motor sem auxílio de pistões. É magnifico, mas...

NENHUM PILOTO ERA JAPONÊS, QUE PENA! Captou o que eu quis dizer com o "dilema"?

Agora prenda-se ao post e acompanhe as outras historinhas que envolvem este fato. O Mazda 787B "abelha" serviu de impulso não só por ter sido um dos primeiros, mas também por ser o mais famoso dos dilemas.

Ah, o 787, que tinha dois pilotos japoneses, terminou em oitavo lugar geral.
A partir dos anos 90 os japoneses começaram a aparecer nas primeiras posições. Antes deste grande feito semi-japonês da Mazda em 1991, a Nissan fez a primeira pole position da história em Le Mans com dois britânicos e um italiano, mas não conseguiu terminar e abandonou depois de 142 voltas. A melhor colocação da Nissan nesta corrida  e com um carro inteiramente composto por japoneses (Kazuyoshi Hoshino, Masahiro Hasemi e Toshio Suzuki), foi um quinto lugar. A Toyota conseguiu um bom segundo lugar em 1992 com o TS010 #33 (Masanori Sekiya, o japonês, o pilotou com Pierre-Henri Raphanel e Kenny Acheson). I need victories from nihon. – Keep calm! Vêm mais uma vitória por aí, que cabe inteiramente na linha do legado dilemático.
Por falta de sorte não tivemos mais um carro japonês vitorioso nas 24 Horas de Le Mans. Em 1994, entrava em cena a polêmica classe GT1, que logo no ano de estreia viu sua principal brecha ser explorada pela Porsche, através da Dauer, construindo um carro de rua baseado no lendário Porsche 962 que dominou o endurance na metade dos anos 80 (incluindo duas vitórias consecutivas em Le Mans). Como nenhum dos pilotos do Toyota 94C-V SARD, segundo colocado, era japonês, o carro passa um pouco despercebido dos arquivos. Um fato curioso deste interessante protótipo V8 3.6 era que um dos pilotos confirmados da corrida era nada mais nada menos que Roland Ratzenberger, o austríaco falecido no fatídico GP de San Marino de 1994 durante os treinos oficiais. Ele era piloto oficial no programa da Toyota e estava escalado para fazer mais uma 24 Horas de Le Mans da sua vida. Como homenagem, a equipe manteve o nome e a bandeira de Ratzenberger na porta do carro e em seu lugar, correu Eddie Irvine.
1995, o ano de estreia da McLaren F1 GTR em Le Mans. Uma corrida tomada pela chuva que resultou na primeira vitória da história do carro, que com o baixo número de protótipos presentes, conseguiu levar a classificação geral. E é a primeira vitória de um japonês: Masanori Sekiya testemunhou este feito histórico do Japão desde a vitória da Mazda em 1991. A Lanzante Motorsports foi para esta corrida sob o nome de "Kokusai Kaihatsu UK Racing", que trouxe como main sponsor a Tokyo Ueno Clinic, um patrocínio inteiramente japonês, mas em um carro e equipe britânica. Naquela época, os projetos inteiramente japoneses eram da NISMO, Toyota (SARD) e Honda (Kunimitsu), que destas três, somente a Honda foi feliz com o primeiro lugar em classe na GT2. O sucesso da F1 GTR, já adorada pelos japoneses e pelo mundo antes do feito, resultou na continuação maciça do projeto, que acabou indo até pro JGTC! Mais tarde, este carro, para combater a concorrência – que de novo estava construindo protótipos na classe GT1, virou um deles através da versão "Long tail", vista pela primeira vez em 1997 e ativo até 2005.
Os anos se passaram e a próxima oportunidade do Japão finalmente terminar a corrida 100% japonesa nas 24 Horas de Le Mans ficou mais próxima em 1998. O R390 #32, com o mesmo trio que chegou em quinto lugar em 1990, conquistou uma honrada terceira colocação, perdendo pro vitorioso Porsche 911 GT1-98 e por outro dele na segunda posição. O carro veio de um projeto ambicioso que contou com a ajuda da TWR (que ajudou a Jaguar em 1988 e 1991 e a Joest, em '96 e '97) depois que a Nissan não deu certo com os GT-R LM, resultando em um carro dificilmente associado à um carro de rua, mas como era a tendência (e a brecha) daquela classe, acabou sendo aceito.
Feito superado pelo seu rival compatriota em 1999. É difícil imaginar, mas o GT-One TS020 conseguiu passar pela vistoria em 1998, quando correu pela classe GT1 e seguiu o exemplo da CLK-LM. A Toyota conseguiu convencer o ACO (Automobile Club de l'Ouest) de que o carro era elegível para a corrida e, por fim, correu como um grand tourer (que de nada tinha além de uma cabine suficiente para um banco de passageiro e um espaço para malas). Um projeto diretamente atenciosamente notável pela suas linhas inovadoras que apresentavam ao mundo o que veríamos anos mais tarde foram vistas naquele carro.

A campanha do Toyota GT-One em 1998, por mais que tenha começado muito boa, terminou amarga. Em 1999, a FIA e o ACO modificaram os regulamentos para que os projetos que vinham sendo desenvolvidos para a classe GT1 acabassem, resultando em abolição desta, mas logo substituída pela classe LMGTP para que não houvesse uma demanda das montadoras oficiais. Já que o centro das montadorasestava na GT1. Isso resultou em algumas modificações para o GT-One de '99. O chassi construído por suporte da Dallara acabou ocupando a primeira, segunda e oitava colocação no qualifying. Mas, na corrida, perdeu dois carros e o único que sobrou (de Keiichi Tsuchiya, Ukyo Katayama e Toshio Suzuki) acabou tendo o pneu traseiro esquerdo deteriorado pelos cascalhos. Os falhos pneus Michelin do TS020 #3 tiraram a chance da Toyota de vencer pela primeira vez as 24 Horas de Le Mans depois de anos consecutivos tentando além de um segundo lugar, seu resultado final nesta corrida e até hoje o melhor resultado 100% japonês combinando carro e trio de pilotos.
E em meio do domínio da Audi na principal classe, em 2003 a Audi se retirou temporariamente como equipe oficial e cedeu alguns de seus muitos R8's aos privados. No ano de 2004, tivemos novamente uma intervenção japonesa na corrida. Dessa vez, vitória geral para o Team Goh, do Japão, que tinha entre os três pilotos Seiji Ara, se tornando agora o segundo piloto japonês da história de Le Mans vencedor na geral. O problema era, no entanto, o mesmo ocorrido nove anos atrás: carro estrangeiro.
Depois desse feito da Audi, a mais próxima aproximação japonesa veio a partir de 2013, quando os Toyota TS030 vieram inovados depois de uma corrida ruim em 2012. Mas, o melhor TS030 colocado, em segundo, não tinha um piloto japonês. Mesma situação para o TS040, que com Kazuki Nakajima como um dos tripulantes, fez pole, largou e manteve-se na primeira colocação até a 14ª hora da corrida. Esses fatos são algo que incrementa o histórico de como está sendo difícil, em pouco mais de 20 anos, do Japão conquistar uma vitória geral nas 24 Horas de Le Mans com um carro japonês e pelo menos um dos pilotos guiantes também japonês.

O Japão consegue ter a proeza de ser o único país que venceu Le Mans com carro nativo, mas até hoje nunca com piloto(s) de nacionalidade nativa. Será que em 2015 veremos, finalmente, um carro e piloto japonês compartilhando a vitória? Fiquemos na torcida – no meu caso, pra Nissan com o GT-R LM NISMO. Um bom sábado a todos!

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